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No mês de agosto de 2003, Marrocos hospedou o II Congresso Mundial da Juventude, que reuniu aproximadamente mil jovens, entre 15 e 25 anos, representando mais de 140 países.
Mais do que apenas discutir clichês, o Congresso foi uma oportunidade de por à prova a tolerância, a solidariedade e a cultura de paz entre os países.
Participei do evento como jovem jornalista, correspondente para o Brasil, integrando uma delegação de mais 11 jovens brasileiros. Foi uma experiência fantástica, sem dúvida, que não ouso começar a relatar sem antes contextualizar o país, sua cultura, tradições, seus habitantes e, claro, sua juventude (nossos anfitriões); tendo como base as conversas, observações e andanças por Marrocos.
Tratar o congresso de forma isolada acaba dando margem para interpretações errôneas e julgamentos precipitados de tudo o que aconteceu por lá.
Veneração, religião e cor
Um pouco de história — “Estado do bem-estar moderno”: é assim que o Reino de Marrocos (monarquia constitucionalista situada no extremo noroeste da África e um dos últimos três reinos que ainda existem no continente) se apresenta para o mundo. Mas nenhum desses termos é adequado para classificar o país se você estiver fincado no pensamento ocidental. Para entender Marrocos – e não julgar –, é necessário desprender-se de todos os conceitos, bases e paradigmas da cultura românica e se transportar para o ano 6.000a.C, quando os berberes, primeiros habitantes da região, estabeleceram-se no país; ou ainda entre os séculos VII e VIII, quando Marrocos foi convertido ao islamismo e unificado como reino pelo chefe árabe Idris ibn Abdallah.
Governo - A chamada monarquia constitucionalista marroquina significa que o Rei (no momento, Mohamed VI, que assumiu o posto de seu pai, Hassan II, morto em 1999) detém o poder e a autoridade do Estado. Apesar de parecer um tanto despótica e absolutista, a monarquia é um dos principais orgulhos para o povo do Marrocos. Além disso, a ascensão ao trono por Mohamed VI é motivo de alegria para a população, pois foi a partir daí que o país iniciou um processo de abertura econômica e cultural que continua até hoje.
Transitar pelo país (seja qual cidade for) é no mínimo curioso: não há lugar onde o rei não se faça presente (mesmo que essa “presença” traduza-se apenas em fotografias, cartazes e outdoors) e não há marroquino (pelo menos os tantos que tive a oportunidade de conversar) que não sinta uma ponta de orgulho de sua família real.
Religião - O único poder capaz de superar o do rei é o do Islamismo, religião de quase 99% da população. Apesar de todo o processo de modernização pelo qual o país vem passando nos últimos anos, é comum (e diria mais, emocionante!) ver mulheres indo ao cinema na cidade de Rabat usando o caftan (véu para cobrir o rosto) ou homens em um cyber-café de Casablanca vestindo djelaba (véu e túnica tradicionais).
E o mais fascinante de tudo é o contraste de opiniões que isso causa: muitos europeus e latino-americanos sentiam pena da “pobre mulher marroquina, obrigada a cobrir-se quase por inteiro em pleno sol de 40ºC”. Enquanto isso, a “pobre mulher” sentia-se orgulhosa por ser “escolhida por Allah e por acreditar que a beleza maior está no interior da pessoa, e não no corpo à mostra”.
No Marrocos, o Islã se faz presente a cada momento... É como se as pessoas fizessem parte da religião e não o contrário. É comum, pelo menos cinco vezes ao dia, escutar do minarete principal da mesquita de cada cidade um chamado para as orações. O mais curioso é que muitas pessoas simplesmente largam seus afazeres, sua tenda de chá, barraca de artesanato e vão direto para o local da reza.
Juventude – Com todos esses elementos culturais e religiosos tão presentes na vida dos marroquinos, é difícil imaginar a vida dos jovens por lá. Mas é mais simples do que parece. O jovem marroquino – assim como de qualquer lugar do planeta – é aberto a novas experiências, culturas e não perde a oportunidade de se divertir.
A classe abastada fala fluentemente o francês e o inglês, está integrada às novas tecnologias e meios de comunicação. E o mais surpreendente: tem grande conhecimento de geopolítica, economia e relações internacionais.
Mas o acesso à cultura é restrito à classe alta. A juventude das camadas mais pobres está cada vez mais deixando o país para tentar a vida no exterior. Muitos estão trabalhando (muitas vezes ilegalmente) em países europeus como Portugal, Espanha e França – em função da falta de emprego e perspectiva de vida: “Infelizmente não há muita esperança de ascensão para o jovem aqui”, reconheceu o jovem Hasni Marouane, lembrando que Marrocos compra tecnologia pronta e não investe nas indústrias e capacitação de pessoal. “As ofertas de emprego ainda estão restritas ao setor agrícola, o que não corresponde mais às
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Luciana Arfelli
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