by Pedro Fernandes de Toledo Piza | |
Published on: Oct 24, 2005 | |
Topic: | |
Type: Opinions | |
https://www.tigweb.org/express/panorama/article.html?ContentID=6436 | |
O Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), considerando os graves impactos negativos que o descarte incorreto de pneus usados causa ao meio ambiente e à saúde humana, veio estabelecer, por meio da Resolução n.º 258, de 2 de dezembro de 1999, regras para o gerenciamento ambientalmente correto dos resíduos gerados após o consumo destes produtos. As disposições contidas na referida Resolução se aplicam tanto aos pneus (ou pneumáticos) novos, assim como aos pneus remoldados e, inclusive, aos inservíveis. Assim, os pneus utilizados devem retornar ao fabricante ou importador para que este proceda seu tratamento e disposição ambientalmente correto, os quais passam a obrigar-se pelo ciclo total de seus produtos, instituindo a responsabilidade “pós-consumo” dos agentes envolvidos com sua produção, importação e comercialização. Como conseqüência lógica, para o cumprimento dessas obrigações, os fabricantes e importadores podem se valer dos serviços de terceiros, sempre na observância de técnicas efetivamente seguras, com vistas a evitar riscos à saúde humana e ao meio ambiente. Um dos princípios que embasa a responsabilidade pós-consumo é o Poluidor-Pagador, em que o responsável pela atividade produtiva deve internalizar os custos ambientais, sob pena de indenizar terceiros pelos danos causados ao meio ambiente. No caso em tela, os fabricantes ou importadores de pneus devem estabelecer regras e procedimentos para que sejam os mesmos, quando inservíveis, a eles devolvidos, a fim de que se proceda ao seu correto processo de remoldagem, ou a correta disposição final, assumindo os danos potenciais causados pela disposição inadequada dos produtos por eles fabricados ou importados. Segundo o princípio 16 da Declaração do Rio de Janeiro (1992), “as autoridades nacionais devem esforçar-se para promover a internalização dos custos de proteção do meio ambiente e o uso dos instrumentos econômicos, levando-se em conta o conceito de que o poluidor deve, em princípio, assumir o custo da poluição, tendo em vista o interesse público, sem desvirtuar o comércio e os investimentos internacionais” (grifamos). Nesse mesmo diapasão, a extinta Câmara Internacional do Comércio, hoje Organização Mundial do Comércio (OMC), consagrou a relevância da aplicabilidade do Princípio do Poluidor-Pagador durante o WICEN II, em Roterdã, no ano de 1992, quando surgiu o conceito de passivo ambiental a ser considerado no balanço das atividades empresariais. Passivo Ambiental refere-se aos danos produzidos pelas atividades comerciais e industriais no meio ambiente, com destaque para a disposição dos resíduos gerados, assim como a utilização dos recursos naturais. A prevenção e o uso de tecnologias limpas nos empreendimentos haverá de reduzir, portanto, este passivo. Exsurgem, portanto, outros dois princípios norteadores do Direito Ambiental: o da Participação/Cooperação Internacional e o da Prevenção/Precaução, já tratados em artigos anteriores. A magnitude da referida resolução é muito maior que a dimensão ambiental, pois vai além, obrigando fabricantes e importadores a assumirem os custos do tratamento correto dos produtos por eles fabricados/importados, e promoverem sua reutilização e reciclagem com metas gradativas a serem alcançadas, o que, diga-se de passagem, é um procedimento fundamental em termos econômicos. Essa chamada “obrigação em cadeia” existe em alguns Estados do Brasil, resultado da aplicação do princípio do poluidor-pagador. Segundo o princípio da legalidade, previsto na Constituição Federal (art. 5º, inciso II), “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Este princípio é atendido na Política Nacional do Meio Ambiente, instituída pela Lei Federal nº. 6.938/81, nos termos de seu artigo 5º, que reza o seguinte: “as diretrizes da Política Nacional do Meio Ambiente serão formuladas em normas e planos, destinados a orientar a ação dos Governos da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios no que se relaciona com a preservação da qualidade ambiental e manutenção do equilíbrio ecológico, observados os princípios estabelecidos no art. 2º desta Lei”. Segundo o Parágrafo Único deste artigo, as atividades empresariais, sejam públicas ou privadas, serão exercidas em consonância com as diretrizes da Política Nacional do Meio Ambiente. Verifica-se, portanto, a legalidade da Resolução nº. 258/99, e sua aplicabilidade para a execução das obrigações ali determinadas, muito embora determinados setores assim não entendam. A preocupação com o passivo ambiental resultante da disposição inadequada de pneus justifica-se pelos sérios riscos que causa à saúde pública e ao meio ambiente. Os efeitos que os resíduos de pneumáticos inservíveis, objeto da Resolução nº. 258/99, causam à saúde humana são altamente nocivos; basta citar, à guisa de exemplo, o acúmulo destes em corpos hídricos propiciando proliferação de insetos sobretudo, o causador da dengue, entre outros feitos adversos ao meio ambiente e à saúde humana. Pelo princípio da legalidade, não pode ser imposto ao consumidor a devolução do produto após o uso, o que já é dificuldade aos que estão obrigados a coletá-los para posterior tratamento. A Lei somente trata de obrigações impostas aos entes potencialmente poluidores, os quais, no caso em tela, são os fabricantes ou importadores, não os consumidores. Ademais, deve ser levado em consideração o efeito cumulativo da poluição difusa, sendo que o volume desse tipo de resíduo tem aumentado a cada dia, não se podendo ao menos prever a quantidade que será descartada futuramente. Conclusões Do exposto, a importação de pneus para o Brasil, com a finalidade de empregá-los na indústria de pneus remoldados, é uma das maiores insanidades já cometidas contra o meio ambiente. Ora, se todo o planeta luta por diminuição de passivos ambientais, produção mais limpa, utilização programada de recursos (não apenas desenvolvimento sustentável), não é razoável nem lógico importar lixo de outros Países. Para espanto geral da nação, existe um Projeto de Lei nº. 216/03 que busca legalizar a importação de pneus usados. Caso este PL seja aprovado, as conseqüências serão catastróficas, por questões ambientais e socioeconômicas: 1) O Brasil passará a receber aquilo que em outros países é considerado lixo. Somente em 2004, entraram no País 7,6 milhões de pneus usados importados. Apesar da falta de dados precisos e transparentes das atividades dos importadores de pneus usados, estima-se que somente 2,5 milhões de pneus poderiam ter sido remoldados; 2) Com o fim da vida útil, os pneus importados terão obrigatoriamente que ser destruídos, o que significa dizer que o Brasil vai ter que fazer a tarefa de outros países, ferindo o princípio do poluidor-pagador; 3) A indústria nacional de pneumáticos se ressentirá dessa importação, tendo em vista uma possível onda de desemprego e crise no setor, entre outras desastrosas conseqüências. Atualmente, já é extremamente difícil realizar “take back” devido à volumosa geração de resíduos, imaginem com a importação de lixo... Essas práticas colocam o Brasil na contra mão do desenvolvimento sustentável, bem como é contrária aos princípios da Prevenção/Precaução, do Poluidor-Pagador, Cooperação Internacional. « return. |