by Luciana Brasil | |
Published on: Aug 4, 2008 | |
Topic: | |
Type: Opinions | |
https://www.tigweb.org/express/panorama/article.html?ContentID=21421 | |
Antes de qualquer coisa, achei importante contextualizar o que viria a ser o termo sexualidade. A sexualidade é um conceito em disputa, que depende do autor, do olhar informado, da área de conhecimento. A sexualidade é uma das dimensões do ser humano que envolve gênero, identidade sexual, orientação sexual, erotismo, envolvimento emocional, amor e reprodução. Envolve, além do nosso corpo, nossa história, nossos costumes, nossas relações afetivas, nossa cultura. A sexualidade na juventude vem ocupando um lugar de extrema importância em temas polêmicos, como a saúde sexual e reprodutiva, a gravidez precoce, o aborto inseguro e as DST e Aids. Em estudo realizado pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), em 2005, a idade mediana para a primeira relação é de 15 anos, quase 3 anos a menos do que na última pesquisa realizada em 2000. Isso mostra que os jovens brasileiros vêm iniciando a vida sexual muito mais cedo. Portanto, é natural que expressiva literatura no campo da sexualidade tenha-se voltado para o lugar da escola e da educação de jovens. No Brasil, a história da educação sexual tem sido marcada por avanços e recuos. No início do século, pela influência das correntes médico-higienistas européias, surgem os primeiros tabus sexuais, que apregoavam o combate à masturbação e às doenças venéreas, visando à preparação da mulher para o papel de esposa e mãe. Em 1928, o Congresso Nacional aprova a proposta de educação sexual nas escolas, seguidos de 50 anos de conturbações causadas pela mídia, a Igreja, enfim. Somente em 1995, com os Parâmetros Curriculares para o Ensino Fundamental (PCNs), orientação sexual é assumida pelo Governo Federal. No ano de 2003, foi lançado pelo Governo Federal, um importante programa de saúde nas escolas sobre disponibilização do preservativo, que, junto com a insistência de que os professores estejam sensibilizados e relativamente preparados para responder quando perguntados pelos jovens sobre temas de sexualidade e atentos para desconstruir violências e discriminações das escolas, acabaram sendo formas básicas de conhecimento e ação nas escolas. Uma pesquisa realizada pela UNESCO em 2004, que envolveu crianças, adolescentes e jovens de escolas do ensino fundamental e médio de 13 capitais brasileiras e do Distrito Federal, apresentou dados preocupantes e ao mesmo tempo surpreendentes. O estudo revelou que a idade média da primeira relação sexual é mais baixa entre os alunos do sexo masculino, variando entre 13,9 a 14,5, enquanto que entre as estudantes do sexo feminino, as idades médias da primeira relação sexual são 15,2 a 16 anos. Em quase todas as capitais, mais de 10% das crianças e adolescentes entre 10 e 14 anos já tiveram uma relação sexual. Um tanto precoce, não? Um 68% dos alunos entrevistados não atribuem valor á virgindade (isso explica a precocidade na iniciação da primeira relação sexual). Como o Brasil é um país historicamente patriarcal, muitos dos entrevistados de sexo masculino, afirmam existir uma forte pressão social para que sua vida sexual comece o mais cedo possível. Um ponto importante levantado pela pesquisa mostra que não há muito diálogo nem por parte dos pais nem dos professores sobre sexualidade e muitas das atividades promovidas pelas escolas são alvos de fortes críticas pela falta de continuidade e monotonia. Essa falta de diálogo ganha mais importância ao se constatar que mais de um terço dos alunos afirmaram não ter conhecimento suficiente sobre DSTs. Em relação à gravidez precoce, o estudo aponta que 14,7% das garotas entrevistadas afirmaram já ter engravidado, pela primeira vez, antes dos 14 anos. Este dado é muito forte, e reflete o fracasso do Estado quanto à elaboração de programas que informem os jovens sobre métodos contraceptivos, planejamento familiar. E ainda há quem diga que o programa de distribuição gratuita de preservativos nas escolas fomenta o sexo precoce. O melhor realmente seria ter meninas com menos de 14 anos grávidas. Os dados coletados sobre o aborto revelam uma anormalidade. Enquanto uma média de 55,15% dos jovens afirmam que conhecem moças ou mulheres que fizeram aborto, apenas 5% declaram ter tal vivência ou familiaridade com o exercício do aborto. Como conclusão, a pesquisa da UNESCO indica que sexualidade é tema que tem prioridade para os jovens, que provoca debates, polêmicas, interesse e atenção. Foi possível também, fazer um mapeamento das marcas de gênero entre os jovens, como o consenso e a alta receptividade entre moças e rapazes no que diz respeito ao valor que se dá à virgindade, já que ambos consideram que isso é coisa do passado. Foi notado também, que as meninas estariam avançando em termos de defender princípios mais igualitários no gênero, como o valor do sexo para ambos os sexos. Considerei muito importante a contribuição desta pesquisa para um entendimento mais profundo sobre o comportamento sexual dos jovens brasileiros. No entanto, essa afirmativa de que a sexualidade é um tema prioritário, contradiz as 22 propostas formuladas pelos jovens na 1ª Conferência Nacional da Juventude, realizada em Abril de 2008. Após três dias de debates, os 2 mil delegados que participavam da Conferência, definiram uma lista com as 22 prioridades, que serão referência para políticas públicas, dos jovens brasileiros. O tema da sexualidade, só aparece como prioridade número 18. (ver lista de prioridades em anexo). A sexualidade continua sendo um tema em pauta, mas cada vez mais, os jovens estão inseridos na formulação de políticas públicas voltadas para outros aspectos sociais. O avanço da tecnologia permitiu um maior acesso à informações, o que levou a um crescimento nas preocupações dos jovens em outras áreas da esfera política, como trabalho, desenvolvimento sustentável, educação, preservação da identidade cultural. Essa abertura de espaço para debate entre os jovens é de grande importância e auxilia o governo na elaboração de programas que inserem a juventude numa agenda prioritária ampla, onde a troca de idéias e experiências podem levar à construção de uma sociedade mais justa e equitativa. Confira as 22 prioridades eleitas pelos 2 mil delegados que participaram da conferência. 1. Reconhecimento e aplicação, pelo Poder Público, transformando em políticas públicas de juventude as resoluções do 1º Encontro Nacional de Juventude Negra (Enjune), priorizando as mesmas como diretrizes étnico/raciais de/para/com as juventudes. 2. Destinar parte da verba da educação no ensino básico para o modelo integral e pedagógico do CIEP’s (Centros In¬tegrados de Educação Pública). 3. Aprovação pelo Congresso Nacional do marco legal da juventude: regime de urgência da PEC n.º 138-B/2003, Plano Nacional de Juventude e Estatuto dos Direitos da Juventude PL 27/2007. 4. Criar uma política nacional de juventude e meio ambiente que inclua o Programa Nacional de Juventude e Meio Ambiente, institucionalizado em PPA (Plano Plurianual), com a participação dos jovens nos processos de construção, execução, avaliação e decisão, bem como da Agenda 21 da Juventude que fortaleça os movimentos juvenis no enfrentamento da grave crise ambiental global e planetária, com a construção de sociedades sustentáveis. 5. Ampliar e qualificar os programas e projetos de esporte, em todas as esferas públicas, enquanto políticas de Estado, tais como os programas Esporte e Lazer da Cidade, Bolsa Atleta e Segundo Tempo com núcleos nas escolas, universidades e comunidades, democratizando o acesso ao esporte e ao lazer a jovens, articulados com outros programas existentes. 6. Garantir o acesso à terra ao jovem e à jovem rural, na faixa etária de 16 a 32 anos, independente do estado civil, por meio da reforma agrária, priorizando este segmento nas metas do Programa de Reforma Agrária do Governo Federal, atendendo a sua diversidade de identidades sociais, em especial aos remanescentes de trabalho escravo. É fundamental a revisão dos índices de produtividade e o estabelecimento do limite da propriedade para 35 módulos fiscais. 7. Reduzir a jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais sem redução de salários, conforme campanha nacional unificada promovida pelas centrais sindicais. 8. Defendemos que a ampliação do investimento em educação é fator imprescindível para construirmos uma educação de qualidade para todos e todas e que consiga contribuir para o desenvolvimento do país. Para tanto, defendemos o investimento de 10% do PIB (Produto Interno Bruto) em educação. Para atingir este percentual reivindicamos o fim da desvinculação das receitas da união (DRU) e a derrubada dos vetos ao PNE (Plano Nacional de Educação). Reivindicamos que 14% dos recursos destinado às universidades federais seja destinado exclusivamente à assistência estudantil por meio da criação de uma rubrica específica. Defendemos também a ampliação dos recursos em assistência estudantil para estudantes do Programa Universidade para Todos (Prouni) e para estudantes de baixa renda de universidades privadas. Garantir a transparência e democracia na aplicação dos recursos. 9. Criação, em todos os municípios, de espaços culturais públicos, descentralizados, com gestão compartilhada e financiamento direto do estado, que atendam às especificidades dos jovens e que tenham programação permanente e de qualidade. Os espaços, sejam eles construções novas, desapropriações de imóveis desocupados ou organizações da sociedade civil já estabelecidas, devem ter condições de abrigar as mais diversas manifestações artísticas e culturais, possibilitando o aprendizado, a fruição e a apresentação da produção cultural da juventude. Reconhecer e incentivar o hip hop como manifestação cultural e artística. 10. Criar o Sistema Nacional de Juventude, composto por Órgãos de Juventude (secretarias/coordenadorias e outros) nas três esferas do Governo, com dotação orçamentária específica; Conselhos de Juventude eleitos democraticamente, com caráter deliberativo, com a garantia de recursos financeiros, físicos e humanos; Fundos nacional, estaduais e municipais de Juventude, com acompanhamento e controle social, ficando condicionado o repasse de verbas federais de programas de projetos de juventude à adesão dos estados e municípios a esse Sistema. 11. Implementar políticas públicas de promoção dos direitos sexuais e direitos reprodutivos das jovens mulheres, garantindo mecanismos que evitem mortes maternas, aplicando a lei de planejamento familiar, garantindo o acesso a métodos contraceptivos e a legalização do aborto. 12. Contra a redução da maioridade penal, pela aplicação efetiva do Estatuto da Criança e do Adolescente. 13. Garantir uma ampla reforma política que, além do financiamento público de campanha, assegure a participação massiva da Juventude nos partidos políticos, com garantia de cota mínima de 15% para jovens de 18 a 29 anos nas coligações, com respeito ao recorte étnico-racial e garantindo a paridade de gênero. Mudança na faixa etária da elegibilidade garantindo como idade mínima de 18 anos para vereador, prefeito, deputados estaduais, distritais e federais e 27 anos para senador, governador e presidente da República. 14. Fim da obrigatoriedade do serviço militar e criação de programas alternativos de serviços sociais não-obrigatórios. 15. Criar o Sistema Nacional de Políticas Públicas de Juventude que confira status de ministério à Secretaria Nacional de Juventude, exigindo que a adesão de estados e municípios seja condicionada à existência de órgão gestor específico e respectivo conselho de juventude. A partir de dezembro de 2009, os recursos do Fundo Nacional de Juventude, do ProJovem e demais programas de juventude, apenas continuarão a ser repassados aos estados e municípios que aderirem ao sistema. 16. Assegurar os direitos dos povos e das comunidades tradicionais (quilombolas, indígenas, ciganos, comunidades de terreiros, pescadores artesanais, caiçaras, faxinalenses, pomeranos, pantaneiros, quebradeiras de coco babaçu, caboclos, mestiços, agroextrativistas, seringueiros, fundos de pasto, dentre outros que buscam ser reconhecidos), em especial da juventude, preservando suas culturas, línguas e costumes, combatendo todas as práticas exploratórias e discriminatórias quanto a seus territórios, integrantes, saberes, práticas culturais e religiosas tradicionais. 17. Estabelecimento de políticas públicas culturais permanentes direcionadas à juventude, tendo ética, estética e economia como pilares, em gestão compartilhada com a sociedade civil, a exemplo dos Pontos de Cultura, que possibilitem o acesso a recursos de maneira desburocratizada, levando em consideração a diversidade cultural de cada região e o diálogo intergeracional. Criação de um mecanismo específico de apoio e incentivo financeiro aos jovens (bolsas) para formação e capacitação como artistas, animadores e agentes culturais multiplicadores. 18. Incentivar e garantir à Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp/MJ) a inclusão em todas as esferas dos cursos de formação dos operadores/as de segurança pública e privada em nível nacional, estadual e municipal no atendimento e abordagem e no aprendizado ao respeito à livre orientação afetivo-sexual e de identidade de gênero com ampliação do DECRADI – Delegacia de Crimes Raciais e Intolerância. 19. Ratificação imediata da Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência da Organização das Nações Unidas (ONU) como emenda constitucional. 20. Garantia de políticas públicas integradas que promovam a geração de trabalho e renda para o jovem e a jovem do campo, com participação da juventude na sua elaboração e gestão. Assegurando o acesso à terra, à capacitação e ao desenvolvimento de tecnologia sustentável apropriada à agricultura familiar e camponesa voltada para a mudança de matriz tecnológica. Transformar o Pronaf Jovem em uma linha de crédito para produção agrícola e não-agrícola. 21. Assegurar, no âmbito das Políticas Públicas de Segurança, prioridade às ações de prevenção, promoção da cidadania e controle social, reforçando a prática do policiamento comunitário, priorizando áreas com altas taxas de violência, promovendo a melhoria da infra-estrutura local, adequadas condições de trabalho policial, remuneração digna e a formação nas áreas de Direitos Humanos e Mediação de Conflitos, conforme as diretrizes apontadas pelo Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci). 22. Estabelecimento de cotas de exibição e programação de 50% para a produção cultural brasileira, sendo 15% produção independente e 20% produção regional em todos os meios de comunicação (TV aberta e paga, rádios e cinemas). Valorização dos artistas locais garantindo a preferência nas apresentações e prioridade no pagamento. Entender os cineclubes como espaços privilegiados de democratização do áudio visual. « return. |